- só os loucos sabem

O meu dedo dormente já a ganhar fola, a pedra gasta a lutar contra a minha teimosia, e dou-lhe mais uma e outra vez. Bem sei que se trata de um isqueiro sem salvação, mas sinto-me forçada a depositar este nervosismo obsessivo nestas tentativas falhadas. Apenas frágeis faíscas estalam, e repetidamente a roldana escorrega sob o movimento cismático do meu polegar quase sem vida. E no meio deste chocalhar, lá vai surgindo uma faísca mais rija, uma pitada de clareza a piscar por entre a escuridão deste quarto embebido em fumo, e no espelho à minha frente, o reflexo do meu olhar vazio e da minha mente perturbada. Com perninhas à chinês e uma postura tensa e arrogante, desmascaro por entre estas feições imperfeitas uma fragilidade escondida, uns dedos de tristeza e um palmo de insegurança. E a par com um novelo emaranhado de pensamentos, estranho esta luz abatida que me iluminava o rosto enquanto tentava perceber quem era. Uma pedra não tão gasta quanto julgava, uma insistência doentia a levar a melhor, ou talvez, apenas um dedo débil e uma falta de jeito a dar das suas durante todo este tempo. Um pequeno movimento delicado, a chama imóvel, e arrasto a carteira vasculhando pelo meio da tralha o único e último cigarro. Dois bafos, sacudo a cinza, e pelo meio de mais uma nuvem de fumo, mais uma faísca reflectida no espelho e uma cabeça a atrofiar de pensamentos.